
Hoje é uma data importante que deve passar desapercebida pela sociedade. O mesmo não pode acontecer com os adventistas do sétimo dia. Segundo o site do Senado Federal: “O dia nacional do combate ao álcool e às drogas acontece no dia 20 de fevereiro para alertar a população sobre os danos que o consumo excessivo de bebida alcoólica e de entorpecentes provoca no organismo. Uma pesquisa da Organização Pan-Americana de Saúde, feita em 33 países da América Latina e do Caribe, identificou que as condições impostas pela pandemia de Covid-19 aumentaram o consumo de álcool. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a dependência em drogas lícitas ou ilícitas é uma doença e um problema de saúde pública que deve ter atenção de todos os países”. Pela gravidade do problema, diversos projetos preveem a regulamentação das propagandas de bebidas alcoólicas “e a promoção de campanhas educativas sobre drogas nas escolas.”[1]
Essas campanhas também são promovidas por instituições privadas e denominações religiosas, como a Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). Uma das entidades mais exitosas no tratamento do alcoolismo, são os Alcoólicos Anônimos, que tem um histórico de recuperação muito alta e um método muito simples e eficaz. Tenho recomendado a participação nas reuniões do grupo para pessoas que já não conseguem viver sem beber[2]
Essas iniciativas públicas e privadas são absolutamente necessárias, pois de acordo com dados atuais da OMS, “3% da população brasileira maior de 15 anos é alcoolista – o que corresponde a 4 milhões de pessoas. Já quando o assunto são drogas, segundo o Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas Pela População Brasileira, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em 2019, 3,2% dos brasileiros usaram algum tipo de substância ilícita nos 12 meses anteriores ao estudo, o que equivale a 4,9 milhões de pessoas. Entre os jovens, o percentual é ainda mais preocupante: 7,4% dos entrevistados entre 18 e 24 anos consumiram drogas ilegais no ano de 2018.”[3]
A pandemia, com as medidas restritivas, o isolamento social e o estresse que causou, gerou o aumento do consumo de bebidas alcoólicas. É provável que o mesmo tenha ocorrido em relação ao cigarro e as demais drogas.
O Dr. Ronaldo Laranjeira, em um artigo intitulado “a pandemia negligenciada do álcool”[4], refletiu sobre esse importante assunto. Ele começa destacando um relatório da OMS, da redução de 35% no consumo de tabaco no Brasil desde 2010, o quer torna o país um dos líderes mundiais na diminuição do número de fumantes. Isso não se aplica ao álcool, substancia “responsável por 4% de todas as mortes no mundo”. Além do aumento do consumo de álcool entre 2013 e 2019, “a ingestão per capita de álcool no Brasil é cerca de 30% superior à média mundial”. Segundo o especialista álcool e drogas, nosso país não foi tão efetivo ao combate do álcool como foi em relação ao fumo.
“O ‘aprecie com moderação’, mensagem comum em peças publicitárias e nos rótulos de bebidas, é um termo tão vago como subjetivo, - e de difícil compreensão. Na verdade, já é consenso na própria OMS, a partir de literatura científica, que não existem níveis seguros de consumo de álcool para a saúde dos cidadãos. Doenças hepáticas, cardiovasculares e gastrointestinais, danos cerebrais e imunológicos, alguns tipos de câncer, pancreatite e outros distúrbios, inclusive psiquiátricos, estão diretamente associados ao uso de bebidas.”[5]
Segundo o site do Senado Federal, um levantamento do Ministério da Saúde “revelou um aumento de quase 20% no ano de 2020 das mortes associadas ao uso de álcool, que potencializa diversas doenças e transtornos.”[6] Esses dados devem nos levar a um renovado compromisso com o combate do álcool. Outra frente difícil, porém, necessária, é a conscientização contra a legalização de drogas, assunto atual nas discussões nos poderes públicas de nosso país.
O historiador Elder Hosokawa, pelas redes sociais, descreveu a participação da IASD no combate as drogas, ao logo do século XX: A Igreja “já foi referência no combate ao alcoolismo e tabagismo no Brasil nos anos 1960-1980. Hoje é o Dia do Combate ao Alcoolismo. Todos estamos sujeitos ao risco de um acidente de trânsito provocado por consumo de terceiros. Em 13 de dezembro de 1853, James White, em artigo na Advent Review and Sabbath Herald afirmou que: ‘A religião, para seu completo desenvolvimento, exige todas as nossas capacidades mentais... Esta droga [o fumo] as danifica. Segue-se consequentemente que, em proporção ao seu transtorno será o efeito de sua ação. De modo que, nesse sentido, pode-se dizer com certeza que a pessoa que usa o fumo não pode ser tão boa cristã quanto o seria sem ele.”[7]
“A IASD, ao longo do século XX, alertava para os males do cigarro mediante artigos publicados nas revistas O Arauto da Verdade, Sinais dos Tempos, Atalaia e Vida & Saúde.”[8]
“Em São Paulo a Escola de Recuperação de Alcoólatras e Fumantes foi criada em 1962 pelo Dr. Ajax Walter da Silveira que dirigiu também o Ambulatório do Viaduto Pedroso PMSP em 1974 e o Pr. Alcides Campolongo (Fé Para Hoje) impulsionaram as campanhas da IASD para eliminar o vício como o programa Como Deixar de Fumar em Cinco Dias (Five Day Plan) idealizado em 1964 pelos médicos J. Wayne McFarland, M.D. e Elman J. Folkenberg nos Estados Unidos. No rádio desde 1943 o programa A Voz da Profecia de Roberto M. Rabelo apresentou palestras sobre estilo de vida, saúde e a necessidade de afastar-se dos vícios, incluindo tabagismo e alcoolismo.”[9]
Segundo a Enciclopédia Adventista “Campolongo foi pioneiro na promoção do curso Como Deixar de Fumar em Cinco Dias na América do Sul. Ele conheceu o método durante a 49ª sessão da Conferência Geral, realizada em 1962 em São Francisco, Califórnia. Após adaptação e tradução do material, ele coordenou o primeiro curso no estado de São Paulo em junho de 1964. Este foi um dos primeiros locais em que o método evangelístico foi aplicado, simultaneamente ao Rio Grande do Sul, sob liderança do Pastor Sesóstris César de Souza. Ao lado do médico Ajax Silveira, Campolongo implementou Escolas de Recuperação para Alcoólatras em vários lugares de São Paulo”.[10]

Ajax participou do lançamento do curso de Campolongo e R. R. Azevedo, que eram secretários do departamento de Temperança da União Sul Brasileira e Associação Paulista, respectivamente. Nesse período, Silveira trabalhava na Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo e era responsável por supervisionar programas do governo, oportunidade que usou para divulgar o curso “Como Deixar de Fumar”. Como consequência, ele participou desses cursos em várias cidades do estado de São Paulo.[11]
Campolongo e Silveira foram homenageados pela Câmara Municipal de São Paulo com a medalha Anchieta por serviços prestados em campanhas promotoras da saúde[12].
Ainda segundo Hosokawa, “a editora CPB lançou livros como ‘Drama do Tabagismo’, ‘O Fumo no Banco dos Réus’, ‘Cigarro: Destrói ou Distrai?’ que foram amplamente espalhados por colportores efetivos e estudantes por todo o Brasil. O alcoolismo e as drogas também foram alvo de muitos lançamentos editoriais, escrita por médicos para leigos como ‘Drama do Alcoolismo’, ‘Ilusão das Drogas’ e ‘Juventude Ameaçada’.
“Existem ainda poucas pesquisas sobre o legado adventista no combate ao hábito de fumar e outros vícios. Sociedades médicas e igrejas evangélicas cresceram ao longo do tempo no apoio a esses esforços. No final dos anos 1980 o Ministério da Saúde passou a se envolver na luta do antitabagismo. Apesar da pressão dos grupos defensores da indústria do tabaco e de bebidas destiladas, leis começaram a ser aprovadas pelo poder legislativo estadual e federal, fazendo avançar as políticas públicas de saúde para reduzir o tabagismo e alcoolismo, com progressiva adesão de lideranças políticas e pesquisadores ligados às universidades. Mas há muito o que fazer, especialmente em campanhas preventivas sobre uso de droga, incluindo o álcool e cigarro, no Brasil e no mundo.”[14]
Vale a pena conhecer a dissertação a seguir; um histórico muito interessante, incluindo a IASD. GONÇALVES, Huener Silva. Antitabagismo no Brasil: da mobilização da comunidade médica à política de Saúde Pública (1950-1986).[15]
“Em 1824 Joseph Bates abandonou o hábito de consumo de bebidas alcoólicas, e em suas viagens pelo litoral da América do Sul, incluindo o Brasil, brindava com uma taça de água, as celebrações regadas a vinho. 200 anos dessa luta que o Brasil só vai de marcha ré, com destaque para as maiores fortunas de brasileiros que produzem cerveja. O livro de Bates está acessível na internet.”[16]
“Ali em Pernambuco, bem como em outros lugares, também fui criticado por meus companheiros por me recusar a beber vinho ou qualquer outra bebida intoxicante com eles, especialmente o vinho na hora do jantar, que era um costume muito comum na América do Sul. Vou contar agora um dos casos que aconteceram: Um grupo grande do nosso pessoal estava jantando com o cônsul americano, o Sr. Bennet. Sua esposa se sentou na ponta da mesa, encheu o copo e disse:– Capitão Bates, posso ter o prazer de apreciar um copo de vinho com você? Dei a minha resposta e enchi meu copo com água. A Sra. Bennet se recusou a beber a menos que eu enchesse meu copo com vinho. Ela já sabia desde nosso primeiro contato que eu não bebia vinho, mas se sentiu inclinada a me persuadir a desconsiderar minhas antigas resoluções. Naquele momento de suspense, a atenção do restante do grupo foi atraída para nós. Um deles disse:– Ora, Sr. Bates, o senhor se recusa a beber um copo de vinho como brinde à saúde da Sra. Bennet? Respondi que não bebia vinho em nenhuma ocasião, e pedi que a Sra. Bennet aceitasse a minha oferta. Ela prontamente condescendeu e brindou à minha saúde com um copo de vinho e eu brindei à saúde dela com um copo de água. O tema da conversa passou a ser o ato de beber vinho e a minha decisão com relação a esse assunto. Alguns concluíram que um copo de vinho não fazia mal a ninguém; verdade, mas a pessoa que bebesse um copo provavelmente beberia outro, e mais outro, até não haver mais esperança de mudar o hábito. Um dos meus colegas disse:– Gostaria de poder fazer como o capitão Bates. Seria bem melhor para mim! Outro supôs que eu era um ex-alcoólatra. Afirmei que certamente não havia mal nenhum em beber moderadamente, mas me esforcei para convencê-los de que a melhor maneira de lidar definitivamente com a questão era não beber bebida alcoólica nunca!”.[17]
Refletindo sobre o assunto, Yuri Tendel lamentou: “Ajudei numa classe da IASD de Campo Limpo, perto do então IAE, que auxiliava pessoas que queriam abandonar o tabagismo e o alcoolismo. Este tipo de atividade hoje é raro nas igrejas, infelizmente.” Samuel Felipe, por sua vez, relembra fatos curiosos, quando a IASD priorizava essas campanhas: “Dentro dessa pegada de combate ao alcoolismo que a IASD tinha eu lembro que no hinário ‘Cantai ao Senhor’, tinha um hino intitulado ‘O álcool’. Eu era criança e rachava rir ao ver que tinha um hino desses. A letra toda era descendo a marretada na bebida alcoólica...”

Eduardo Santos também dá seu testemunho: “Até os 38 anos (2013) frequentei a IASD de Vila Ré (APL-SP) e ajudava na Escola de Recuperação de Alcóolatras e Fumantes. Nesta igreja desde 1972 até hoje (2024) toda sexta-feira - inclusive feriados de ano novo e natal - tem reunião. É um trabalho de homens e mulheres fiéis à causa, muitos são ‘ex-viciados’. O trabalho deles é citado na autobiografia do pastor Alcides Campolongo. Muitas pessoas auxiliaram nas campanhas, inclusive o Dr. Ajax Silveira.” Esse ministério, na Vila Ré começou em 28 de outubro de 1972, mas temos registro na Revista Adventista que na década de 1960 foi realizado o curso antitabagismo promovido pela Igreja de Vila Ré em um cinema que tinha da Rua Itinguçu.
Penso que o Adventismo precisa voltar a enfatizar o combate aos vícios modernos, especialmente o uso de drogas. Embora tenhamos adotado outras importantes campanhas (como o quebrando o silêncio e o Vida por Vidas), precisamos continuar apoiando essa importante causa, tanto na prevenção (campanhas de conscientização)[18], informação (publicação de literatura), como no tratamento (cursos e terapia com acompanhamento profissional e espiritual). Especialmente nossas instituições de saúde deveriam usar os recursos que tem para ajudar os milhões de brasileiros que estão escravizados pelos entorpecentes.
Nesse sentido, Ellen White, uma promotora da temperança escreveu:
“O fumo, seja qual for a forma em que for usado, afeta a constituição física. É um veneno lento. Afeta o cérebro e embota as sensibilidades, de maneira que a mente não pode discernir com clareza as coisas espirituais, em particular as verdades que teriam a tendência de corrigir essa satisfação sórdida. Os que usam o fumo em qualquer forma não se acham inocentes diante de Deus.”[19] Ela afirmou ainda que “O álcool e o fumo corrompem o sangue dos homens, e milhares de vidas são anualmente sacrificadas a esses venenos.”[20]
Com isso em mente, devemos, por um lado, lembrar as pessoas que nosso “corpo é o templo do Espírito Santo”. (1 Coríntios 6:19); adverti-las que “se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá; porque o templo de Deus, que sois vós, é santo.” (1 Coríntios 3:17) e motivá-las a portanto, “quer comais quer bebais, ou façais, qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus.” (1 Coríntios 10:31).
Ribamar Diniz é Mestre em Teologia (SALT/FADBA), Especialista em Missão Urbana (FADBA) e Mestre em História Social (Unifap). Atualmente é membro da Sociedade Criacionista Brasileira e pastor na Missão Pará-Amapá.
Referências:
[1] Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2023/02/17/dia-nacional-de-combate-as-drogas-e-ao-alcool. Acesso: 19 de fevereiro de 2024.
[2] Mais detalhes em https://www.aa.org.br/. Acesso: 20 de fevereiro de 2024.
[3] Dia Nacional de Combate às Drogas e ao Alcoolismo. Disponível em: https://www.valesaude.com.br/saude-v/dia-nacional-de-combate-as-drogas-e-ao-alcoolismo-qual-e-o-objetivo/. Acesso: 20 de fevereiro de 2024.
[4] Ronaldo Cajazeira, em um artigo intitulado “a pandemia negligenciada do álcool, Folha de São Paulo 18.02.2024
[5] Ronaldo Cajazeira, em um artigo intitulado “a pandemia negligenciada do álcool, Folha de São Paulo 18.02.2024.
[6] Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2023/02/17/dia-nacional-de-combate-as-drogas-e-ao-alcool. Acesso: 19 de fevereiro de 2024.
[7] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[8] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[9] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[10] The Brazilian White Center – UNASP, Campolongo, Alcides (1925–2019). Disponível em: https://encyclopedia.adventist.org/article?id=CGGK&lang=pt#fn97, Acesso em 20 de fevereiro de 2024.
[11] The Brazilian White Center – UNASP, Silveira, Ajax Walter César (1917–2011). Disponível em: https://encyclopedia.adventist.org/article?id=9GP0&lang=pt. Acesso em 20 de fevereiro de 2024.
[12] The Brazilian White Center – UNASP, Silveira, Ajax Walter César (1917–2011). Disponível em: https://encyclopedia.adventist.org/article?id=9GP0&lang=pt. Acesso em 20 de fevereiro de 2024. Alcides Campolongo, Evangelismo: Minha Paixão (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2009), 68, 69, 77; “Pastor Campolongo: Cidadão Paulistano,” Revista Adventista, novembro, 1987, 31; e Gomes, Márcio B., “Longa Semeadura,” Revista Adventista, novembro, 2015, 44.
[13] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[14] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[15] GONÇALVES, Huener Silva. Antitabagismo no Brasil: da mobilização da comunidade médica à política de Saúde Pública (1950-1986). Belo Horizonte, MG. 2009.226 p. Dissertação de Mestrado História. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG.
[16] Elder Hosokawa, mensagem enviado pelas redes sociais, no Grupo Cientistas Adventistas, no dia 19 de fevereiro de 2023. Usado com permissão.
[17] [...] BATES, Joseph. Aventuras do Capitão José Bates. Jasper, Oregon, USA: Biblioteca de Pioneiros, 2017. p. 176-177. Disponível em: https://cdn.centrowhite.org.br/home/uploads/2022/11/As-Aventuras-do-Capitao-Jose-Bates.pdf. Acesso: 19 de fevereiro de 2024.
[18] “Educai o povo em hábitos corretos e práticas saudáveis, lembrados de que um grama de prevenção vale mais que um quilo de cura. Conferências e estudos neste ramo se demonstrarão do mais alto valor.” Carta 17a, 1893.
[19]Ellen G. White, Conselhos Sobre Saúde, pág. 81.
[20] Ellen G. White, Health Reformer, novembro de 1871.
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